A Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional voltou ao centro das atenções com a negociação de uma nova verba extra de fim de ano, apelidada de “emenda panetone”. A proposta, que prevê repasses de cerca de R$ 3 milhões para cada integrante da comissão e R$ 5 milhões para os relatores setoriais, reacende o debate sobre o uso político das emendas parlamentares e o controle dos recursos públicos.
O apelido irônico não esconde a gravidade do que está em jogo. Chamar de tradição algo que se repete à margem da lei é admitir a institucionalização de um vício. O argumento de que a prática ocorre “todos os anos” não justifica o uso de dinheiro público como ferramenta de barganha entre Executivo e Legislativo. É, no mínimo, um desrespeito à transparência e à sociedade que financia cada centavo dessas liberações.
A disputa sobre a origem dos recursos — se das emendas de comissão ou do orçamento direto do governo — revela o esforço conjunto de ambos os lados em manter a política das sombras. O uso da rubrica RP2, defendido por integrantes da Comissão de Orçamento, tem um único efeito prático: dificultar o rastreamento e blindar os verdadeiros beneficiários das emendas.
O Orçamento de 2025, com R$ 50,3 bilhões em emendas parlamentares, já é um retrato do desequilíbrio entre o poder político e o planejamento técnico. O aumento explosivo desses valores desde 2020 reduziu drasticamente a autonomia dos ministérios e transformou as emendas em instrumentos de poder institucional. Parlamentares passaram a controlar até 70% dos recursos de custeio e investimento das pastas — um poder que não vem acompanhado do mesmo grau de responsabilidade.
Quase três décadas após o escândalo dos “anões do Orçamento”, a Comissão Mista de Orçamento volta a ser palco de manobras opacas e disputas por verbas sem transparência. O risco é o mesmo de antes: o dinheiro público virar ferramenta de poder pessoal. E, mais uma vez, quem paga a conta é o cidadão que assiste ao espetáculo sem ser convidado para a festa.